O Douro abre caminho através de uma terra cada vez mais fértil. O verão chega ao fim e as caves preparam-se para a vindima. A obra do fotógrafo de Valladolid, Gonzalo Miguel Ojeda, realizada há cem anos, traz até aos nossos dias esta série de imagens de mulheres em plena vindima pelas terras de Burgos. O Douro encarregou-se de fertilizar as suas margens e os carros de bois aproximam-se para transportar os cestos carregados de uvas.
«Os melhores soldados de cavalaria do esquadrão eram os que tinham sido trabalhadores de enxada da vinha na margem do Douro. Neste ofício é necessário ter muita força e um braço muito musculado»..
Pío Baroja
El escuadrón del Brigante [O Esquadrão do Bandido]
1913
Aragonez, garnacha tinta, cabernet sauvignon, merlot, malbec ou para os brancos, albillo mayor... Todas elas, variedades da denominação Ribera del Duero. A sua capital, Aranda de Duero. E, como ilhotas de pedra espalhadas pela grande planície, os conventos e mosteiros, centros nevrálgicos da indústria vitivinícola desde tempos imemoriais.
Natureza-morta com quatro cachos de uvas
Por volta de 1636. Óleo sobre tela, 45 x 61 cm
Museo do Prado
Quase acariciando as águas do Douro, ergue-se o mosteiro de La Vid, originalmente situado na margem direita, com o nome de Santa Maria del Monte Sacro. Mas, em 1152, Afonso VII de Leão doou a herdade de La Vid, situada na outra margem do rio, para edificar o atual mosteiro. Diz a tradição que nesse mesmo local se encontrou uma imagem em pedra policromada: a Virgem da Vid.
«La Vid é uma aldeia ou uma localidade constituída principalmente por um bloco habitacional ligado ao antigo mosteiro de Premonstratenses, situado nas margens do Douro. O mosteiro de La Vid era uma grande fortaleza de muralhas maciças, implantado nas margens do Douro. Possuía uma ponte de pedra comprida e estreita com nove vãos (olhos), sobre o rio e magníficas propriedades, prados, campos, florestas e pastagens».
Pío Baroja
Con la pluma y con el sable [Com a pena e com a espada]
1921
É Rafael Alberti quem nos introduz no coração de Aranda de Duero. Corria o verão de 1925 e o poeta acompanhava o seu irmão, representante das caves Osborne, numa viagem pela província de Burgos. Durante o périplo, o poeta escreveu La amante, um livro que se abre a novas formas de expressão lírica onde o rio Douro não passa despercebido.
¡Levanta!
Que a corrente do Douro
Segue tão apressada, que o ar
lhe pulverizou o sonho.
¡Minha barca!
¡Levanta-te!
Rafael Alberti
La amante (Canciones) [A amante (Canções)]
1925 [Excerto]
2.º Suplemento de Litoral,. Málaga. Imprenta Sur, 1926, p. 20.
Um pouco mais a norte, a escassos quilómetros do rio, ergue-se no horizonte o castelo de Peñaranda de Duero. A partir do alto, podemos viajar no tempo e imaginar o poeta a cruzar o seu olhar com o daquele carroceiro...
Porque me olhas tão sério,
carroceiro?
Tens quatro mulas tortas,
um cavalo dianteiro,
um carro de rodas verdes,
e a estrada toda
para ti,
carroceiro.
Que mais queres?
Rafael Alberti
«PeñAranda de Duero». La amante (Canciones) [A amante (Canções)]
1925
Carroceiro transportando carvão de cisco em Covaleda de la Sierra
1924
Archivo de la Diputación de Burgos
Novamente o rio, amante,
e outra ponte sobre o rio.
E outra ponte com dois olhos
tão grandes quanto os meus.
Tão grandes quanto os meus,
minha amante.
Os meus olhos, quando olho para ti!
Roa del Duero.
Rafael Alberti.
«Roa de Duero». La amante (Canciones) [A amante (Canções)]
1925. 2.º Suplemento de Litoral, Málaga. Imprenta Sur, 1926, p. 18